Não penses que te safas assim. Era bom que fosse tudo tão fácil, mas não queiras ser como eu.

Passados tantos anos - sim, anos- ainda não consigo acordar e passar um dia que seja sem me lembrar dele, porque tudo nesta maldita cidade tem que ter um traço, uma recordação, em cada recanto, em cada beco sem saída.

Se pensares bem não é assim tão humilhante evitares viver numa constante hipotetica durante tempos sem fim. Um passado presente, com rasgos de alegria por estares fora e de tristeza por te aperceberes que nunca te conseguiste livrar de uma pessoa. Quem marca pela primeira vez, marca para sempre, e isso nem tu, nem eu, nem ninguém consegue evitar, a menos que o fim seja isso mesmo, um fim. Sem ressentimentos, sem remorsos, arrependimentos, saudades e uma sensação térpica de que não foi tudo arrumado e guardado.

Há sempre uma parte do cérebro que não processou, e a nossa garganta não engole, o nosso estômago não digere, o nosso coração não filtrou. Umas vezes apetece-me gritar, e falo por mim. Cair-lhe aos pés, beijá-los se necessário. O orgulho privou-me disso e agora é tarde demais, talvez há muito tempo atrás tenha sido útil fazer isso.

Não te posso garantir nada, é só um pressentimento, mas não desistas ainda. Olha que um dia também tu acordas e vives no inferno de ter um nó na garganta, e só aí é que percebes que foi tarde de mais.